domingo, 17 de janeiro de 2016

Apostando contra

Margot Robbie explica o subprime
Mesmo depois de tantos filmes sobre a crise econômica de 2007-08, eu ainda consigo me confundir quando chegam para mim falando sobre CDO, swaps e outros termos do gênero. E não ajuda muito quando a Margot Robbie aparece nua numa banheira de frente para o mar para explicar o que é subprime. É óbvio que você não vai prestar atenção no subprime da mesma forma que parou de ler esse texto ao ver a foto acima. 

Mas valeu a tentativa. Aliás, valeu demais a tentativa Adam McKay. "A grande aposta" é o filme mais pop de todos já feitos sobre a crise. É um filme com a cara da corneta. Cheio de referências totalmente excelentes no roteiro e tentando fazer o cidadão comum entender o economês, essa língua do capeta. 

Acima disso tudo, porém, é possível tirar duas lições do filme: 

Não pareço o Lars Ulrich?
1. Todo homem que escuta heavy metal está à frente do seu tempo e é capaz de prever o futuro. Eu sempre soube disso. Pesquisadores britânicos já comprovaram que pessoas que ouvem heavy metal são 34,78% mais inteligentes do que os apreciadores de outros gêneros. 

2. Como o Steve Carell pode ser um bom ator! Eu dei uma olhada no perfil dele no Linkedln do cinema, ou seja, o Imdb, e tem pouca coisa relevante que ele tenha participado. Entre elas, "Pequena Miss Sunshine" (2006) e "Melinda e Melinda" (2004) em 73 trabalhos. Mas quando ele se leva a sério, ou alguém o leva a sério, caso de McKay, que lhe deu um dos protagonistas do filme, ele até pode brilhar. 

Em "A grande aposta", Carell é Mark Bauman, um dos caras que se deram bem ao preverem com dois anos de antecedência que a bolha imobiliária iria estourar deixando milhares de desempregados, desabrigados e fodidos em geral. Foi um período devastador. Bancos faliram, outros foram salvos pelo governo americano, mas nada menos que US$ 5 trilhões sumiram do mapa. É muita grana.

Mas Bauman não foi o primeiro a descobrir que ia dar merda. Esta profecia coube a Michael Burry (Christian Bale, mais uma vez bem demais num papel). 

Burry era um cara esquisito com um olho de vidro que trabalhava de bermuda e descalço (um sonho!) e ouvindo heavy metal (isso eu ainda consigo fazer nos feriados). Um dia ele estava ampliando a mente e dando uma espairecida com uma sequência de Metallica e Slayer quando percebeu que havia alguma coisa errada com as hipotecas. Estava rolando uma dose alta de inadimplência, em torno de 4%, naquilo que era visto como o investimento MAIS SEGURO de todos. Mas Burry pensou: "Isso vai feder. E, em 2007, quando a taxa de inadimplência chegar a 8%, o mercado vai quebrar e eu vou lucrar bilhões. Vou investir alguns milhões nisso". 


É claro que Burry foi ridicularizado, chamado de maluco para baixo. Os metaleiros visionários são sempre incompreendidos. No fim, para desespero de milhões de americanos e de Wall Street, ele estava certo. Fedeu demais. A merda foi para o ventilador em velocidade cinco em meio a um sistema fraudulento em que as agências de classificação de risco perderam total credibilidade porque não eram tão independentes quanto se imaginava (Incrivelmente, parece que elas recuperaram tudo).

Outros caras que previram a chegada do apocalipse também lucraram muito com a quebra dos bancos e o estouro da bolha. Eles são os vilões do filme? Aqueles que alisam o seu cheque de US$ 470 milhões? (É com você mesmo que estou falando, Ryan Gosling!). Ou é o sistema, que provou não ser tão seguro quanto pregava? Afinal, como diria o Capitão Nascimento o sistema é... deixa pra lá. Esse texto já estourou a cota de palavrões.

McKay deixa para o espectador refletir. A questão é: se você tivesse a chance de lucrar ao perceber o que estava acontecendo, você faria isso ou não? Este é o grande dilema de Bauman no filme. O que deve prevalecer: a raposa do mercado financeiro ou o lado humano, demasiado humano?

Carell: 'Eu posso ser sério, Ryan!'
"A grande aposta" é um filme muito divertido. Uma excelente comédia (acho que dá para chamar de comédia) em que há um louvável esforço em fazer o espectador se entreter e ao mesmo tempo entender tudo o que aconteceu com a economia naqueles anos complicados. As esquetes inseridas no meio do filme (ainda tem um chef em um restaurante e a Selena Gomez explicando o CDO enquanto joga cartas em Las Vegas) e a quebra da quarta parede ao estilo Frank Underwood tornam tudo mais leve e inteligível em meio a verborragia econômica.

E ainda tem uma trilha sonora maravilhosa, pois qualquer trilha sonora que tenha Metallica, Nirvana, Guns N'Roses e Led Zeppelin é maravilhosa. No fim, o que fica é o recado de Robert Plant e Jimmy Page: "If it keeps on rainin', levee's going to break/ When the levee breaks/ I'll have no place to stay ("Se continuar chovendo, as barragens irão romper/quando a barragem romper/não terei onde ficar". 

Ah, vocês ainda estão ai? Não ficaram paralisados na foto da Margot Robbie? Bom, então aqui vai a cotação final da corneta. "A grande aposta" vai ganhar uma nota 8,5.


Indicações ao careca dourado: melhor filme, diretor (Adam McKay), ator coadjuvante (Christian Bale), roteiro adaptado e edição.

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