quarta-feira, 30 de março de 2016

Batman vs Superman: um 7 a 1 do cinema

Onde é a festinha à fantasia?
Poucas pessoas ficam até os créditos finais de um filme. Até aquele momento em que aparece que Pascoal Gumercindo foi o assistente de maquiagem do senhor Cavill e Josefina Andrews foi a cabeleireira para cenas de ação da senhorita Gadot. A corneta fica em ocasiões especiais. E foi lá que ela viu uma situação que soou como uma anedota. Nos agradecimentos especiais de "Batman vs Superman: a origem da Justiça" estava o nome de Frank Miller.

Miller é um gênio responsável por histórias clássicas do Demolidor e do Wolverine e por um cânone dos quadrinhos chamado "Batman: o cavaleiro das trevas" (1986), justamente a HQ que tem a tão comentada batalha entre o Batman envelhecido e o Superman em um futuro distópico. Eu não posso falar por Miller, mas se fosse ele ficaria envergonhado diante do trabalho equivocado (eu quis ser educado) de Zack Snyder no cinema.

Confesso que a última vez que fiquei tão constrangido em uma sala de cinema foi quando vi "Cinquenta tons de cinza". A diferença é que não fiquei anos esperando para ver esse Sabrina gourmetizado.

E ATENÇÃO: A PARTIR DE AGORA É METRALHADORA DE SPOILERS EM TEXTÃO.

"Batman vs Superman" não é um filme baseado em "O cavaleiro das trevas". E Snyder já havia deixado isso claro. A questão é que o que ele nos apresenta como solução para este filme que seria o embrião da Liga da Justiça é um nada. Uma junção de erros, atuações sofríveis, roteiro sem pé nem cabeça e mal escrito e um filme que é sem ritmo e até mal editado.

Passamos mais de uma hora e meia indo de uma cena a outra sem que uma coisa tenha qualquer contato com a cena seguinte e a anterior. O que Zack queria? Nunca saberemos. Só o que sabemos é que ele pegou duas ótimas histórias (além do "Cavaleiro das Trevas" há ecos de "A morte do Superman" ali) e transformou num papelão digno de filme do "Quarteto Fantástico".

Os problemas de "Batman vs Superman" são tantos que vou fazer em lista para facilitar o trabalho:

1- Ben Affleck não pode fazer filme de super-herói. Ele destruiu o Demolidor, que ficou mais de uma década no limbo até ganhar uma segunda chance. Obrigado, Netflix, te amo. Seu Bruce Wayne é aquela coisa inexpressiva, olhar de estou zangadinho com o mundo, com um grisalhinho próximo às orelhas dignos de quem esqueceu de passar Grecin. ‪#‎voltaChristianBale

2- Henry Cavill, amigos, não funciona quando não está brigando. Eu disse isso em "O homem de aço" (2013) e mantenho a crítica.

Eu sou mais bonito que você
3- O Batman não tem superpoderes, mas tem dinheiro, que é praticamente um superpoder. Como é que ele resolve achar que o Superman é responsável pelas mazelas do mundo sem apurar direito com todas as suas fontes? Cara, a desculpa de que é supostamente a primeira aparição do Superman não cola. Até porque ele fica dois anos remoendo uma raivinha de quem perdeu a Mulher-gato para o melhor amigo sem ter apurado direito os benefícios que o Homem de aço fazia ao planeta.

4- A obsessão patológica dele pelo Superman, com direito a recortes de jornal na parede também não cola. Afinal, cuidar de Gotham City dá trabalho. Tem Coringa, Pinguim, Espantalho, Duas-Caras, Bane, Hera Venenosa... Entre outros. Não dá para fazer clipping do noticiário da cidade do outro lado da ponte.

5- Jesse Eisenberg, pede para sair. Esse Lex Luthor misto de "sou descolado, como balinha de ursinho, uso tênis e trabalho no Google" com "tenho um parafuso a menos e devia estar no asilo Arkham" não combina com o Lex Luthor. Está caricato, está boboca e nada tem a ver com Lex Luthor. Deu saudade do Gene Hackman. E acho que até do Kevin Spacey.

6- Esse negócio de Lois Lane (Amy Adams) ser uma jornalista tão fodona a ponto de saber sem NENHUMA apuração onde encontrar o Superman para salvá-lo da morte ou saber tudo o que acontece apenas com dois pedaços de informação é uma piada.

7- O filme tenta levantar duas discussões atreladas aos dois heróis principais. Os limites do poder do Superman e os métodos pouco ortodoxos do Batman em lidar com o crime. Falha em ambos porque o roteiro é banal e tão profundo quanto piscina de bebê. No caso do Superman parecia um episódio de "Supergirl".

8 - Excesso de flashbacks sem sentido (todo mundo sabe como os pais do Bruce Wayne morreram), alucinações desnecessárias...

9- Zack Snyder tentou repetir uns truques de "Watchmen" e a coisa ficou tosca. Toda aquela câmera lenta, todos aqueles olhares perdidos ao infinito. Meu Deus, que triste.

10- E chegamos ao momento ÚNICO E FREUDIANO. O mais constrangedor de todos! Quando Batman e Superman estão brigando no recreio da escola como dois coleguinhas que se desentenderam, tudo fica bem quando o Batman descobre que, além de órfãos, ambos têm uma mãe de mesmo nome: Martha. Sim, é assim que acontece, com direito a uma sequência de diálogos dignos de novela mexicana.

Mas nem tudo é um horror no filme. Destaquemos quatro pontos positivos.

1- A trilha sonora épica. Eu gosto de trilhas sonoras épicas como se fosse a última guerra do planeta antes do Apocalipse.

2- Jeremy Irons manteve a dignidade do Alfred.

3- A participação da Mulher Maravilha (Gal Gadot) com seus cabelos esvoaçantes padrão Beyoncé, escudo, espada e chicotinho dourado. Ela bem que tentou salvar o filme, mas naquela altura do campeonato já tinha saído até o gol do Khedira e a tragédia estava consumada.

4- A luta entre Batman e Superman, quando o Morcego dá uma bela surra no Homem de Aço, o fazendo até perder o penteado perfeito cheio de gel. É uma pena que a motivação dela tenha sido pífia, e o desfecho patético. Aliás, nenhum personagem parece saber o que está fazendo no filme.

É lamentável que "Batman vs Superman" seja uma tragédia. No mundo atual, não cabe mais filme ruim de super-herói. São outros tempos. Mas Zack Snyder resolveu entrar em campo para levar um 7 a 1 cinematográfico. É com pesar que a corneta dará ao seu filme uma nota 2,5.

Nenhum comentário: